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Conhecimento e divulgação científica da Criminologia

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O que é a Criminologia?

  • Foto do escritor: CrimiThink
    CrimiThink
  • 29 de fev. de 2020
  • 7 min de leitura

Atualizado: 14 de abr. de 2020


Aquela que parece ser uma uma questão relativamente simples de responder pode ser bastante traiçoeira. O que é afinal a Criminologia? O que estuda e o que a distingue de outros campos do saber que estudam o crime? E que funções pode desempenhar um criminólogo?



Quem estuda Criminologia sabe exatamente que, na maioria das suas conversas, quando refere o que estuda, as respostas mais prováveis de se ouvir são: "Ah, então vais andar a investigar crimes!", ou então, "Vais ser investigador criminal, como no CSI."



No entanto, não só a Criminologia não é responsável, nem pretende, formar investigadores criminais ao estilo "CSI", como se distingue deste campo com o qual costuma ser confundida: a Criminalística. A Criminalística é uma sub-disciplina do ramo das Ciências Forenses (o conjunto de ciências responsáveis por auxiliar na aplicação da lei) e é sobretudo responsável pela recolha, análise e interpretação científica dos vestígios recolhidos no local do crime com o intuito de estabelecer conexões entre os elementos recolhidos e o crime, auxiliando no processo de investigação e na descoberta da verdade. Assim aquilo que vulgarmente conhecemos enquanto "CSI" são as tarefas desempenhadas pelos órgãos de polícia criminal no âmbito da Criminalística, não se devendo confundir isso com Criminologia. Portanto, lamento muito, mas tenho de, não só despedaçar os sonhos de todos os que pensavam que por estudarem Criminologia se iriam tornar no próximo Sherlock Holmes ou Horatio Caine (CSI: Miami), como também os sonhos dos vossos queridos amigos e familiares que ainda acham que por estudarem Criminologia vão trabalhar no FBI ou ser detetives privados.


Porém, isto não quer dizer que o estudo da Criminologia seja menos intrigante e relevante em termos práticos. Aliás, atrevo-me a referir que o espectro de aplicação da Criminologia na sociedade é tão amplo e necessário que são poucas as áreas onde esta não se pode exercer. Mas primeiro importa começar por clarificar o que é a Criminologia.


A Lei nº 70/2019, que veio reconhecer a profissão de criminólogo e regular o exercício da sua profissão define a Criminologia como "a profissão que, na área das ciências sociais, analisa e estuda o fenómeno criminal, presta apoio às instituições de controlo e colabora na realização da prova pericial, entre outros atos de natureza análoga.". Apesar de esta definição sintetizar bem o âmbito profissional da Criminologia, a verdade é que peca por alguma falta de especificidade. Com isto não se pretender referir que não seja adequada ou ajustada à realidade. Na verdade, o que acontece é que a Criminologia tem sofrido de alguma imprecisão na definição devido às suas raízes históricas e à sua interdisciplinaridade. Por estas razões, talvez seja mais fácil começar por definir Criminologia tendo em conta aquilo que ela não é.


Desde logo, Criminologia não é apenas falar sobre tudo que envolve o crime. Ou seja, Criminologia não são opiniões pessoais ou profissionais, não é pensar e falar de forma desestruturada e sem critério sobre o crime, o criminoso, as causas do seu comportamento e as consequências a que deve estar sujeito. A Criminologia é uma disciplina científica, como tal serve-se da utilização de um método científico rigoroso e empírico, afastando-se do que é considerado senso comum e discursos morais e legais. Por estas razões se tende a referir que a verdadeira Criminologia científica nasceu com a Escola Positivista Italiana, sob a efígie de Cesare Lombroso, que, apesar das duras críticas metodológicas de que foi alvo, foi o primeiro a tentar diferenciar através da utilização do método experimental o criminoso do não criminoso.


David Garland (cit. in Newburn, 2007) argumenta que a Criminologia moderna é produto de duas distintas correntes de trabalho que acabaram por se fundir e formar o que hoje conhecemos como Criminologia:


  • o projeto de Lombroso, que visou distinguir as características do criminoso em relação ao não criminoso através de um método empírico, buscando a etiologia do comportamento criminal;

  • e o projeto governamental que abriu precedentes para que fosse possível estudar de forma empírica as instituições e os organismos responsáveis pela administração da justiça (i.e., polícias, tribunais, prisões, etc.).


Por aqui podemos imediatamente inferir que a Criminologia não se preocupa apenas em estudar o criminoso e o crime. Como refere Cusson (2011, p. 28), "O crime está no coração da Criminologia. No entanto (...) o coração é apenas um órgão entre outros". A Criminologia importa-se com o fenómeno criminal como um todo. Por estas razões, Sutherland & Cressey (1978) definem a Criminologia enquanto o estudo da elaboração das leis, da quebra das leis e da reação social à quebra das leis. Esta definição enumera aqueles que são os 3 pilares do estudo da Criminologia:


  • o estudo do crime;

  • o estudo daqueles que cometem o crime;

  • e o estudo da reação social e do sistema de justiça penal ao crime.


Ou seja, desde logo a Criminologia interessa-se por perceber o porquê de apenas alguns comportamentos serem tipificados como crime. Apesar de a Criminologia absorver as teorias e os conhecimentos que são estudados e desenvolvidos em disciplinas como a Sociologia, a Psicologia, o Direito e mesmo a Medicina, a lente analítica sobre a qual o objeto de estudo é observado e analisado é distinta. Daí que Walklate (2005) refira que o que distingue a Criminologia das restantes áreas de investigação não é simplesmente o interesse pelo crime, mas sim o facto de explorar o porquê de se estudar o crime. E a verdade é que apesar de tomarmos o conceito de crime enquanto garantido, aquilo que definimos como crime pode ser visto de uma perspetiva jurídica, sociocultural ou histórica, tendo diferentes implicações na forma como analisamos o fenómeno criminal. O crime deve ser visto como um conceito mutável e por estas razões é que se torna tão importante estudá-lo.


Com o estudo daqueles que cometem crimes a Criminologia procura, entre outros aspetos, entender quais as condições que podem aumentar a probabilidade da ocorrência de certos tipos de crimes, quais os mecanismos utilizados pelos criminosos para delinquir, quais as motivações para o crime, quais as diferenças entre criminosos e não criminosos. A importância de se estudar estes atores reside desde logo na noção de prevenção precoce, na identificação dos fatores associados à criminalidade e no desenvolvimento de programas de prevenção primária, destinados à população em geral, secundária, destinados a populações em risco, e terciária, destinados a populações que já evidenciam problemas. A prevenção precoce de comportamentos antissociais é crucial para evitar o desenvolvimento de futuros comportamentos delinquentes. Numa fase posterior, quando os indivíduos já se encontram desenvolvidos, a intervenção é fundamental como forma de diminuir o risco de reincidência. Como tal, é necessário desenvolver conhecimento sobre os fatores que subjazem a condutal criminal e desenvolver programas especificamente dirigidos às necessidades dos indivíduos que cometem crimes. É necessário conhecer o risco que comportam para a sociedade e agir em função desse risco. É também em função do conhecimento dos ofensores e dos seus comportamentos que a Criminologia auxilia no desenho e avaliação de programas de prevenção do crime, assegurando que os investimentos que são realizados são os mais eficazes na prevenção do crime.


Com o estudo da reação social e do sistema de justiça a Criminologia procura perceber ao nível da sociedade e das instituições de justiça como é que estas lidam com o crime e os criminosos, através, por exemplo, do estudo da insegurança e do medo do crime, da forma como o crime pode ser construído socialmente, da forma como as sentenças são atribuídas pelos tribunais, das perceções públicas relativamente à reinserção dos ofensores na comunidade, entre outros aspetos. Além disso os próprios órgãos de polícia criminal são objeto de estudo quanto aos vários tipos de policiamento, à sua eficácia e os seus impactos no crime e na sociedade, quanto à sua legimitidade, ou seja, a forma como são percebidos pela sociedade ao nível da sua atuação.


Por todas estas razões, os criminólogos têm a oportunidade de ter uma formação multidisciplinar que lhes confere uma série de competências de interpretação e análise do fenómeno criminal, que lhes capacita para exercer profissionalmente em, citando o artigo 4º da Lei nº 70/2019, "tribunais, gabinetes de mediação, estabelecimentos prisionais, serviços de reinserção social, avaliação de risco e competências do ofensor, centros educativos para menores delinquentes, centros e projetos de prevenção e tratamento da toxicodependência, orgãos de polícia criminal, equipas de gestão e local de crime, laboratórios de polícia técnico-científica, serviços de inspeção, serviços de informações, comissões de proteção de crianças e jovens, centros de acolhimento e de assistência a vítimas, autarquias locais, polícia municipal, forças e serviços de segurança, empresas de segurança privada, projetos de investigação científica e em universidades".


Ou seja, os criminólogos têm as competências para constituir uma mais valia em praticamente todos os domínios da sociedade. A sua formação exigente dota-os de um grande conhecimento quer em metodologias qualitativas, quer quantitativas, que são fundamentais para a compreensão do fenómeno criminal, dota-os não só das capacidades, mas das sensibilidades e cuidados necessários para trabalhar eficazmente quer junto de vítimas, quer junto de ofensores, transmite-lhes todo o know-how necessário para investigar cientificamente o fenómeno criminal e trabalhar em políticas públicas melhor fundamentadas.


Assim, apesar de por vezes não ser fácil sintetizar o que é Criminologia, parece ficar claro que o âmbito de aplicação, a pertinência e o objetivo da Criminologia na sociedade atual vai muito além do que se faz em "CSI". É um facto que a Criminologia se interessa pelo crime. A forma como estuda e investiga cientificamente o fenómeno criminal como um todo é que a caracteriza e diferencia do simples conhecimento do crime. Fica ainda muito por dizer em relação à Criminologia, no entanto, o objetivo deste blogue será mesmo esse, transmitir e dar a conhecer aquilo que se faz no seio desta disciplina e transmitir a sua utilidade em contexto prático, quer ao nível da proteção da sociedade, com a orientação de políticas públicas de controlo, gestão e prevenção do crime mais eficazes, quer ao nível do melhor funcionamento das instituições do sistema de justiça.



Referências bibliográficas:

  • Cusson, M. (2011). Criminologia (3ª edição).

  • Newburn, T. (2017). Criminology (3rd edition).

  • Sutherland, E. H., & Cressey, D. R. (1978). Criminology. JP Lippincott.

  • Walklate, S. (2005). Criminology, the Basics.

 
 
 

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